Especialistas alertam que a crise climática está impactando o destino das abelhas e exigindo medidas de mitigação e adaptação nos sistemas de produção. Não apenas a produção de mel, mas a segurança alimentar global enfrenta riscos diante de ondas de calor, secas e inundações que têm atingido as atividades de criação de abelhas.
A apicultura (criação de abelhas africanizadas, a Apis mellifera) e a meliponicultura (criação de abelhas-nativas-sem-ferrão) são atividades de grande importância econômica, social e ambiental no Brasil. No entanto, os efeitos da mudança climática, além de prejudicarem a produção de mel, também afetam de maneira negativa a biodiversidade e a segurança alimentar global, devido à dependência da polinização para a produção de alimentos.
A pesquisadora Fabia Pereira, da Embrapa Meio-Norte, acredita que é fundamental desenvolver e implementar medidas de mitigação e adaptação para garantir a resiliência desses sistemas produtivos diante dos eventos climáticos extremos. Ela afirma que os apicultores e meliponicultores em diversas partes do mundo já percebem os efeitos da mudança climática em suas atividades. “A frequência e a intensidade de eventos climáticos extremos, como secas prolongadas, chuvas torrenciais e enchentes representam desafios significativos para a sobrevivência das colmeias e a produtividade da cadeia apícola. A urgência da situação exige uma resposta coordenada e eficaz para minimizar os prejuízos e garantir a sustentabilidade das atividades”, afirma.
Segundo a Federação Apícola e de Meliponicultura do Rio Grande do Sul, durante as enchentes que ocorreram naquele estado em 2024, entre 35 mil e 60 mil colmeias foram destruídas, causando impacto direto na apicultura, meliponicultura e produção de alimentos que dependem da polinização. Anteriormente, em 2016, também houve registros de perdas de insumos e equipamentos de produtores na Argentina e em outros estados do Brasil. No Piauí, o município de Esperantina sofreu muitos prejuízos em 2018.
Incêndios também têm prejudicado colmeias de vários países além do Brasil, como Portugal, Espanha, Austrália e Canadá. O fogo consome as colmeias e o pasto apícola, que é o conjunto de plantas que fornecem os recursos necessários para alimentação de abelhas e para a produção de mel, pólen, própolis e cera.
Municípios de São Paulo, do Pantanal Matogrossense e até da região amazônica têm sentido os efeitos dos incêndios. “As colmeias que não são afetadas pelo fogo, sofrem com os efeitos da fumaça. Estudos demonstram que a qualidade do ar foi afetada a distâncias que variavam de 120 km a 300 km de distância. As queimadas que atingiram o Pantanal em 2020 afetaram dez estados brasileiros, chegando à região Sul do país”, afirma a pesquisadora Fábia Pereira.
Cientistas projetam um cenário preocupante para o clima brasileiro até o ano de 2100, alertando para um aumento de até 6°C na temperatura caso as emissões de gases poluentes se mantenham elevadas. As previsões indicam que todos os biomas do país serão afetados, com destaque para a Amazônia, que pode registrar um aumento de temperatura entre 1°C e 6°C, acompanhado por uma redução nas chuvas que varia de 10% a 45%.
No Pantanal, a temperatura deve subir de 1°C a 4,5°C, enquanto a diminuição das chuvas pode atingir entre 5% e 45%. Já no Pampa, a elevação da temperatura esperada é de 1°C a 3°C, com uma redução de 5% a 40% no volume de precipitações.
A Caatinga, por sua vez, pode sofrer um aumento térmico de 0,5°C a 4,5°C, e uma queda nas chuvas que varia de 10% a 50%. Para a porção Nordeste da Mata Atlântica, a previsão é de um incremento na temperatura entre 0,5°C e 4°C, e uma redução de 10% a 35% nas chuvas.
No Cerrado, as temperaturas podem se elevar de 1°C a 5,5°C, com uma diminuição de 10% a 45% nas chuvas. Finalmente, a porção Sul/Sudeste da Mata Atlântica deve registrar um aumento de temperatura de 0,5°C a 3°C, e uma redução de 5% a 30% nas chuvas. Essas projeções demonstram a urgência de ações para mitigar os impactos das mudanças climáticas no Brasil.
Para fazer frente a todos esses desafios, os pesquisadores destacam a importância de desenvolver práticas que permitam às colônias resistir melhor a variações climáticas extremas; capacitar criadores de abelhas para um manejo que preveja e minimize os impactos de eventos climáticos; promover a pesquisa de novas tecnologias e variedades de abelhas mais resistentes, bem como de flora apícola adaptada a diferentes condições de clima; além de fortalecer políticas públicas que apoiem o setor na recuperação após desastres e na implementação de medidas preventivas.
Para Fábia é importante encarar a mudança climática não apenas como um problema ambiental, mas como uma ameaça direta à produção de alimentos e à subsistência de comunidades rurais. A vulnerabilidade do setor apícola, evidenciada pelos impactos que tem sofrido, exige uma ação colaborativa entre cientistas, governos, associações de produtores e a sociedade em geral para garantir a proteção das abelhas e, consequentemente, a sustentabilidade da vida no planeta. A promoção de tecnologias e práticas adaptativas é um caminho apontado para mitigar os impactos e assegurar o futuro da apicultura e meliponicultura.
Com informações da Embrapa
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